Éverton
Santos
Para escrever esta
crônica cheia de olheiras, deixo que o tempo seja nada mais que o barulho dos
ponteiros. Neles, a noite cai, chuvosa, como em lamento: e vejo as ruínas de um
cemitério que antes era palácio. Perder um amor é tornar-se um vivo-morto.
Cai por terra um ciclo
formado por dias, meses, anos; sms,
músicas e presentes; ficadas, namoro e casamento. O que antes era uno, mesmo
sendo duplo, volta a ser dois, dissolvido pela traição, pelo desgaste, pela
distância. O riso ressoante é substituído pela lágrima abafada pelo
travesseiro; as mãos já não se dão, esfriando-se, solitárias; o coração -
núcleo da emoção - guerreia contra o cérebro - centro da racionalidade -, numa
batalha em que loucura é consequência da devastação de um devastador conflito
interno.
Perder alguém... Mas será que algum dia tivemos esse alguém?
E o que fazer com as lembranças, com as memórias, com aquilo que fica daquele
que vai? Porque algo sempre fica. Seja saudade, tristeza, decepção, esperança. E há vida depois de tal fatalidade? Pois,
na véspera, no dia último em que vida era vida, tudo estava em paz, mas, num
rompante, palavras duras em voz de violino violentaram a alma, enegreceram um
céu dantes límpido.
Então, inicia-se o fim.
Às vezes, inevitável; outras, necessário; por vezes, dolorido.
E há o reerguer-se. Mas como, se, depois de tudo, os outros
são os outros e só?! Porque... porque as declarações ficam cravadas, as
promessas são recordadas, os futuros desenhados nos crepúsculos coloridos, ah, estes continuam luzindo. E com força! Ficam, abandonadas no
passado, a fera solta que encontrou domador; a carência apaziguada pelos beijos
ao luar; e a incompletude que se completou enquanto se nutria da outra
presença!
E os amigos em comum? Como é que você ‘tá’? Você supera. Talvez
tenha volta. Não se preocupe, outra pessoa virá. As malditas comparações, o
medo de encontrar outra pessoa que traga à tona os sofrimentos silenciados. Na
verdade, o medo que mais cresce é o de saber que é possível amar de novo, já
tendo amado uma vez! Será que o poço do
amor um dia seca?
No entanto, nem tudo
está perdido, pois há vida, aquela mesma que se diz não pertencer mais a si,
depois de ter sido dada a quem a desperdiçou. Mas, o difícil ainda se enreda: tempos
infindos pensando naquele alguém que te roubou de ti. Já no plano real, ir de
volta pra casa, onde haverá apenas um prato na mesa, uma cama fria: calar o
caos. Esquecer quem amamos é como tentar se lembrar de quem nunca conhecemos:
impossível usufruto.
“O sândalo perfuma o
machado que o feriu”. Isso passa, não é? É só ficar ali, inerte e inerme, me deixa aqui, quieto, amanhã é outro
dia, isso passa. E se vê a depressão
de onde é possível se jogar no escuro. Agora, só existe isso em mim: ausência
de ti, por isso a escuridão.
E, por mais que pareça
cocaína, afirmo: é só tristeza. A
multidão me cerca, mas não me preenche. Fiz planos, tracei metas, morri no
litoral, onde o vento nos abençoava. A palavra “término” não existia, pois eu
só pensava no “final feliz”, sem saber que, depois do começo, o que viesse
começava a ser o fim. E este chegou, se instalou, foi meu homicida.
O bom de chegar ao fim
do poço é que a única solução é voltar para a superfície.
Gostei muito! Parabéns!
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