Éverton Santos
Era
feriado da Independência e meu grupo de amigos decidiu visitar o Parque
Nacional Serra de Itabaiana, em mais um passeio turístico. Chegando lá,
inventaram de subir a serra, e eu, disposto, me convidei para a empreitada já
feita antes, mas nunca com eles. Esperto que sou, achei por bem escalar de pés
descalços e, além da bermuda do corpo, levei apenas uma garrafa de água de meio
litro, mas com apenas metade de conteúdo. Éramos um total de sete audazes
desbravadores.
Bem
no começo da viagem, senti o efeito da falta dos chinelos, ou do tênis, neste
caso. Sem camisa, com minha garrafa nas mãos, as pedras lisas ou pontiagudas
nos pés, a altitude e a pressão atmosférica incidindo sobre meu corpo naquele
calor. Com uns quinze minutos de subida, fizemos o primeiro pit stop. Minha água escassa saciou a
sede de todos, com curtos goles. Mas, depois, o único sinal de líquido que eu
via e sentia era o suor salgado e incessante. A essa altura, minhas pernas reclamavam
das dores capazes de me imobilizar, mas, entre ais de murmúrios, decidi seguir.
Caminhamos,
subimos, suamos, reclamamos, pedi arrego mais uma vez. E então, sob o sol
fervente e mesmo na ausência de árvores, sentamos na vegetação rala e
acolhedora, apesar de incomodativa. Em cada parada, que se tornava frequente, as
forças se restabeleciam e, rapidamente, se esvaíam quando recomeçávamos. E foi
na terceira estação que algo surpreendente me marcou.
Fraquejei
e arriei novamente, estava obstinado a deixá-los ir sem mim. Eu os esperaria
ali, sentado ou deitado, mas não me moveria mais; estava esgotado, quase sem
forças, sedento de um golinho de água e o que eu via era só vegetação, cidades
lá embaixo, céu azul e algumas nuvens acima. Minha visão estava embaçada,
minhas pernas pareciam não me obedecer, e eu disse em fraco altissonante, com a
voz morta: “Podem ir, eu desisto, vou esperar vocês aqui.” Meu afilhado, três
anos mais novo que eu, olhou pra mim, se compadeceu e replicou: “Não, você vai
com a gente, sim!, nem que pra isso a gente tenha que parar umas cinquenta
vezes!” Subitamente, senti a força em mim, me revitalizei, tirei ânimos não sei
de onde, e seguimos sem que eu pensasse mais em ceder. Minha meta era chegar ao
topo, e eu tinha que dar o meu melhor se quisesse chegar lá.
E
eis que, metros adiante, já perto do cume, havia algo que considerei ser um
milagre, uma arquitetura divina. Desenhado no meio das rochas, um riacho gelado
me esperava de filete aberto, e eu me deliciei, matando minha sede e
recuperando minha vivacidade. Agradeci a Deus - em silêncio e em altos louvores
- por aquele momento, e eu agradecia também ao meu afilhado, que, sem saber,
tinha me impulsionado a continuar e não desistiu de mim quando nem eu em mim
acreditava mais.
Por
fim, concluímos nossa escalada, em triunfo; tiramos fotos, nos demoramos a contemplar
a imensidão dos arredores, brincamos, rimos, jubilosos pelo mérito conseguido.
Descansados e sem sede, começamos a fazer o trajeto de volta, com a garrafa
cheia, com as memórias de um trajeto difícil, com a satisfação de dever
cumprido. Éramos fortes e invencíveis: titãs.
Hoje,
lembro que meus pés sofreram, que minhas pernas enfrentaram a fraqueza extenuante,
que minha sede me levou à estafa, ao esgotamento. Mas, passada a façanha,
recordarei pra sempre a sensação da fé percorrendo o meu corpo, as minhas
forças recompondo-se como por milagre, e uma voz a me dizer que não me deixaria
desistir. Nessa subida, pude elevar meu pensamento ao céu, ao sublime, e
agradecer por Deus ter falado comigo através do meu afilhado e por me dizer, de
forma tão íntima e profunda, que não posso desistir das minhas missões. E isso
nunca!
Muitas vezes na vida precisamos de alguém que nos mostre o quanto ainda temos forças para continuar. Linda sua crônica, Éverton. E muito inspiradora também. Parabéns, querido!
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