Éverton
Santos
Em tempos de
ciberespaço, o “kkk”, o “rsrs”, o “hahaha” ou o “shashashahshash” substituem o
verdadeiro riso por uma forma artificial de prazer e de descontração. Com a
ajuda dos muitos emoticons - desenhos
capazes de sintetizar e reproduzir o estado de espírito -, a tarefa fica ainda
mais fácil, porque é simplesmente colocar uma cara feliz, sorridente, ainda que
isso não reflita, literalmente, o comportamento e o ânimo daquele que o usa.
Do mesmo modo acontece
quando a emoção é o choro. Posso dizer que você me fez chorar só pra fazer com
que se enterneça e se sinta mal, como se isso fosse capaz de criar uma conexão,
através da compaixão forçada. Você, do outro lado da telinha, não terá como
comprovar - a menos que tenha uma webcam ligada! - se estou me derramando em
prantos soluçantes. Chega-se à conclusão de que as lágrimas não precisam mais
ser o líquido salgado produzido pelos olhos. Basta simplesmente representá-las,
desenhá-las numa face deprimida e pronto: estou chorando.
E quem quiser que prove
o contrário.
No caso da amizade e
dos vínculos afetivos, a coisa se torna mais complexa. Cativar alguém, torná-la
próxima, isso é algo que deve levar tempo. E eu disse “deve”. Ser cordial é
fácil, até mesmo um psicopata ou um sociopata conseguem ser. Esbanjar simpatia e
posar de “bom moço” são papéis que não é preciso ser ator para poder
representá-los com perfeição. Logo, ter os sentidos atentos nunca é demais. Ser
cauteloso ainda continua sendo uma forma eficaz de não ser enganado.
Na verdade, parece que
a carência afetiva é a causadora de tudo. Basta ser carinhoso, ter um bom papo,
dar atenção e demonstrar interesse: são estes alguns ingredientes para uma
“amizade virtual” bem sucedida. Acrescente-se a isso o contato contínuo, a
compreensão, o bom humor... Tais atributos são valorizados dentro e fora do
ciberespaço, mas parece que, na era digital, sai na frente quem convence pela
imagem construída por intermédio da internet.
Uma vez, uma prima me
disse que as pessoas das redes sociais dela eram mais legais que as da vida
real. Apenas pelo contraste entre o mundo “fictício” e o “real”, já me interessei
pelo assunto. São quase que completamente diferentes. Isso porque, nos sites de
relacionamento, posso ser quem eu quiser, posso montar perfis à vontade, além
de estar ao meu alcance nunca evidenciar os maiores defeitos da minha
personalidade. Sem contar que é bem mais legal uma conversa cara a cara, um
abraço corpo a corpo, um passeio que não se limita a abrir e a fechar páginas
da web. Foram estes os meus argumentos para mostrar à minha prima que eu - que,
de fato, existia - tinha o potencial que todos os amigos virtuais juntos não
conseguiriam ter: eu tinha - e continuo tendo - uma existência concreta, e não
encarcerada em quadrados digitais.
Sim, a internet revolucionou o mundo; sim, é
possível manter contato com pessoas que estão há milhares de quilômetros; sim,
há quem tenha encontrado o best friend
forever ou o amor da vida utilizando esse meio de comunicação cuja
importância, incontestável, pode levar a crer que, se fosse suprimido, a
humanidade, talvez, não conseguisse mais progredir. Mas não é sobre isso que
estou falando. Não é uma questão de importância, mas sim de ser quem se é.
Estão em pauta os
sentimentos: o riso saudável e vivo; o choro que escorre pela face; a amizade
como laço indissociável capaz de durar anos infindos; o amor puro, que cresce
através do convívio, das descobertas diárias. Isso, como diz a propaganda, não
tem preço.
Eis a era do medo e da
desconfiança. Eis o tempo em que parece fácil manipular os outros simplesmente
fingindo ser aquilo que nunca se pretendeu ser ou fingindo sentir o que nunca
sentiu. Como consequência, é tempo de escancarar as portas dos olhos e perceber
que muitos são os que podem conhecer o seu nome, mas poucos, o seu sobrenome.
Ser solícito e amigável não significa excluir ninguém. Mas deve significar ser
seletivo. Deve significar estar atento.
Humildade sempre; ser
verdadeiro... também.
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