Flávio Passos
Segunda-feira, cinco horas da manhã.
Acordo, tomo banho e vou trabalhar. Como sempre, saio sem tomar meu café da
manhã (e mamãe sempre diz que essa é a refeição mais importante do dia, pois
sua função é repor as energias perdidas durante a noite).
Saindo de casa, vou para o ponto de
ônibus, que fica na famosa Praça da Igreja Matriz. Enquanto espero a chegada do
ônibus, avisto uma família de desabrigados que forma um grupo de sete pessoas:
um homem, uma mulher e cinco crianças. Acredito que os adultos sejam os pais daqueles
pequenos. A mais velha dentre as crianças deve ter no máximo dez anos. É a
única acordada e chora muito. Ela está sentada sobre um papelão sujo ao lado de
seus irmãos deitados espremidos um atrás do outro como sardinhas dentro da lata.
Ela fala para a mãe que sua barriga dói muito. A mãe, com um bebê no colo, manda
a pequena voltar a dormir, pois, dessa forma, a barriguinha vai parar de doer.
Meu ônibus chega, subo, e me aconchego
em uma poltrona. Ainda com a cena familiar na cabeça, constato a importância do
café da manhã de que mamãe sempre fala. Ele é essencial para o nosso dia pelo
poder que tem de repor as energias que perdemos durante o sono. Porém, tal como
a família me fez ver, algumas pessoas não têm o direito de repor suas energias
pela manhã, não por optarem por não se alimentar, mas sim pela miséria em que
vivem e que passam a carregar nas costas assim que são jogadas dentro desse
mundo tão desigual. Essas pessoas não precisam de uma “esmola” mensal para que
seja extinta a fome, esse mal que a humanidade ainda segura pela mão. Precisam,
sim, de oportunidades. E a nós compete quebrar essas divisórias que forma a desigualdade social, destruí-las
como foi feito com o Muro de Berlim e construir um mundo melhor combatendo os
salmões que impedem a felicidade dessas indefesas sardinhas.
A partir desse dia, não saio de casa sem
tomar meu saboroso café da manhã.
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